segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

O CANTO DA FIGUEIRA-BRANCA

O CANTO DA FIGUEIRA-BRANCA
A figueira-branca de Ouro Branco/MG. Foto: @wilerjrxd


Escutei a figueira-branca cantar.
Corri a pegar papel e caneta
antes que aquela proeza acabasse.

Como pode cantar uma árvore?

Folhas, galhos, troncos, pendões cantam?
Vasos de seiva e raízes grossas gorjeiam?

Os sons, as vozes, os gritos, os cantos

me chegavam aos ouvidos vindos de todos
os seus lados, vencendo até mesmo os ruídos
inconvenientes e desgostosos dos veículos na rua.

Eram chiados ora oscilantes, ora constantes,

como as cigarras bem sabem pronunciar;
gritos agudos e compulsivos, ao mesmo tempo
reclamões e gargalhosos, bem parecidos com
aqueles das maritacas e dos papagaios;
sons harmônicos e doces,
tais quais os esbanjados aos ares pelos canarinhos;
sons mais austeros e curtos,
daqueles que só o bem-te-vi sabe soltar;
gorjeios dançantes e envolventes,
daqueles que saem pelo bico azul do sanhaço-cinzento;
sons mansos, breves e tímidos,
assim mesmo como os do pardal
(que atrás deles camufla sua esperteza sorrateira
em invadir as cozinhas das casas e beliscar
os pães e bolos mal escondidos);
gargarejos agudos e inebriantes,
que só o papa-capim sabe desatar dos minúsculos pulmões;
murmúrios roucos e contidos, quase inaudíveis,
como os da bela juriti.

Todos se misturavam

e se tornavam um só canto,
um só gorjear com frequências inconstantes,
o que singularizava aquela atônita beleza.

O canto da figueira-branca

me envolveu por toda aquela tarde,
até que as nuvens brancas empreteceram,
uma chuva forte ameaçou desabar
e a grande árvore se calou.

Wiler Antônio do Carmo Jr.


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